STF julga se acordos ou convenções coletivas podem ter seus efeitos prorrogados mesmo após o fim do período de sua validade, a chamada ultratividade dos acordos trabalhistas

A Súmula 277 do TST impôs ultratividade em relação aos acordos ou convenções coletivas de trabalho. Tal instituto equivale à prorrogação dos efeitos dessas normas coletivas, mesmo após seu prazo de vigência. Os acordos coletivos e convenções coletivas são instrumentos de negociação pelos quais se criam direitos e obrigações complementares aos direitos já estabelecidos em lei.

A ultratividade tem sido aplicada fortemente em benefício do empregado, o que deu ensejo a discussões sobre se tratar de uma prática protecionista da Justiça Trabalhista. O julgamento em curso no Supremo Tribunal Federal tem por objetivo decidir se novos acordos e convenções coletivas substituirão plenamente os anteriores e se a ultratividade criada jurisprudencialmente é constitucional ou não.

A Corte Constitucional brasileira normalmente não conhece de recursos contra decisões trabalhistas porque o Tribunal Superior do Trabalho acumula competência para decidir se questões afetas à sua competência podem, potencialmente, conflitar com a Constituição da República, mas, nesse caso, o STF instaurou sua jurisdição, e na sessão do dia 04/08/2021 (quarta-feira), o Tribunal avançou no julgamento da ADPF 323, tendo o seu relator – Min. Gilmar Mendes – votado em favor da declaração de inconstitucionalidade da referida súmula. O Ministro Relator fez fortes críticas em seu voto:

 

“Ao passar a determinar a vigência de cláusulas coletivas a momento posterior à eficácia do instrumento ao qual acordadas (a chamada ultratividade), a Justiça trabalhista, além de violar os princípios da separação dos poderes e da legalidade, também parece ofender a supremacia dos acordos e das convenções coletivas. É evidente, portanto, a existência de preceitos fundamentais potencialmente lesados na questão aqui discutida”.

“Não são raros os exemplos da jurisprudência a indicar que a própria súmula – que objetiva interpretar dispositivo constitucional – é interpretada no sentido de ser aplicável apenas a hipóteses que beneficiem um lado da relação trabalhista. Em outras palavras, decanta-se casuisticamente um dispositivo constitucional até o ponto que dele consiga ser extraído entendimento que se pretende utilizar em favor de determinada categoria”.
Acompanharam o entendimento do Relator, os Ministros Nunes Marques, Alexandre de Moraes e Luís Roberto Barroso, somando quatro votos pela inconstitucionalidade.

Em contraponto, votaram em favor da constitucionalidade os ministros Edson Fachin e Rosa Weber, tendo o primeiro, reconhecido a constitucionalidade da Súmula 277, ao argumento de que o decurso do tempo consolidou a norma, que já produz efeitos “desde 2012, praticamente a 10 anos”. Ressaltou também que há jurisprudência de que tais instrumentos coletivos de negociação são fonte de direitos dos trabalhadores.

A Ministra Rosa Weber defendeu a constitucionalidade e ressaltou que “a norma privilegia a negociação coletiva e promove a equivalência das forças das entidades sindicais e empregadores.”

É uma tema complexo também se considerado que a reforma trabalhista alterou a CLT e proibiu tal efeito ultrativo, conforme se verifica do art. 614, §3º: Não será permitido estipular duração de convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho superior a dois anos, sendo vedada a ultratividade. (Redação dada pela Lei nº 13.467, de 2017)
O julgamento foi suspenso por pedido de vistas do ministro Toffoli.